A força da sutileza
Oscar Araripe é um pintor que acredita na força da sutileza. Em suas telas, ele nos ensina que a suavidade é mais forte que a agressão nua e crua, porque nos faz pensar. Nessa perspectiva, a sua figuração é construída por um mínimo de traços e signos, resultado de um esforço de síntese visual, marcado pela consciência do ofício e pela singularidade da expressão.
Ninguém sabe como era a face de Tiradentes. Por isso, faz sentido a proposta do pintor, de retratar Tiradentes de modo estilizado e atemporal, transformando-o em luz que ilumina as noites que brotam das profundezas do nosso país. Por isso, também, a figura de Tiradentes desponta gigante sobre a paisagem, porque sua imagem não foi destruída pela corrosão do tempo: ele se tornou personagem imenso da nossa história, símbolo maior das lutas do nosso povo pela conquista de sua liberdade política. A túnica azul faz do protagonista dessa pintura uma presença leve, celestial, no seu sacrifício pela felicidade dos outros. A corda que cumpriu a infame sentença se desfaz no ar, transformada em frágil dança de fios, pela força da história que marcou Tiradentes como herói e não como criminoso. Seu rosto parece conter muitos olhos, muitas outras faces humanas. O Tiradentes de Araripe é plural, é feito de muitos homens, muitas lutas e muitos sofrimentos.
Ao fundo, vemos a paisagem montanhosa de Minas Gerais, ocupada por algumas casas em estilo colonial, moradias populares e prédios de governo. Símbolos do Brasil colonizado, contra o qual Tiradentes se insurgiu. Igrejas coloniais registram a força da fé católica em nossas terras, herança portuguesa do nosso povo, registro de uma época em que os líderes religiosos aliavam-se aos interesses dos nobres e por isso fizeram vista grossa para o martírio do animoso alferes.
Acima da montanha habitada, Araripe nos brinda com a serra que é pura natureza, curiosamente plasmada em cores complementares: o amarelo quente, luminoso, e o violeta frio e triste. A natureza, o mundo, se oferece ao ser humano como estímulo de sentimentos antagônicos, cenário de altos e baixos, tabuleiro de vitórias e derrotas. Mensagem tão forte quanto sutil, que é passada ao observador pela conotação e denotação das cores...
No alto, à esquerda, um disco celeste, mescla de Sol e Lua, magnetiza a paisagem, ambíguo, sólido e líquido ao mesmo tempo, instaurando a força do devir, do fluxo do tempo feito de instantes, sobrevoando uma imagem claramente atemporal.
Para felicidade geral, agora essa pintura repleta de sentidos sutis passou a integrar, permanentemente, o acervo artístico do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Um presente que muito enriquece a Justiça mineira, porque emociona e faz pensar.
Mário Margutti
Crítico e historiador de Arte